Educação para a Vida

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Não vou cansar de falar do tema enquanto achar necessário: Não há outro propósito na existência de qualquer instituição educativa a não ser a função de educar para a vida. Não bastassem as afinidades do nosso sistema escolar com os cárceres (uniformes, grade curricular, pátios áridos, altos muros, sirene entre as aulas), seu ensino continua estanque, longe do ser humano e esse conceito forma a sociedade. Por isso corremos o risco permanente quando vamos ao médico de joelho, por exemplo, que nos medica com um anti-inflamatório que há de arrasar a flora intestinal, ofender o fígado, para salvar o joelho. É como se o resto do corpo não fosse assunto desse médico, como se um joelho fosse não uma parte, mas um paciente inteiro (por sinal incompleto). Por causa dessa contradição o aluno tem diarréia no dia da prova sobre aparelho digestivo sem saber que na prática a prova já começou. Nele. No corpo dele. Sigo na certeza de que os mais simples conhecimentos da ciência, da medicina, precisam estar na sala de aula. Todo menino deveria aprender a medir a pressão, contar batimento do pulso, saber respiração boca-a-boca, reconhecer a emergência para tirar de uma crise ou salvar seu semelhante e até ele próprio. É dever da escola “ensinar sobre as drogas, explicar cientificamente o que acontece com o cérebro quando usamos cada uma delas: cocaína, crack, álcool,maconha, ecstasy e etc”, diz a minha querida  poeta Roseana Murray.  E” mostrar os dois lados, sem ter medo da verdade”.  Penso que é também dever da escola a interdisciplinaridade entre as matérias porque não há Geografia sem História, nem História sem Biologia, nem Biologia sem Física, nem Física sem Química. Assim como há Matemática na Música e Português na Medicina. Não faz sentido que essas matérias sigam dissociadas feito o joelho e o fígado de um paciente dissecado por uma noção equivocada da saúde e de bem estar da civilização. Da mesma maneira tanto a família quanto a escola se complicam quando o assunto é sexo. Ensinamos aos nossos filhos e alunos os nomes da nossa composição: olho, boca, orelha, nariz. Mas ao chegar na pélvis fica todo mundo gago e com milhões de inexplicáveis apelidos: bumbum, pipi, pintinho, perereca, papica, e um desfilar de adjetivos sem fim cujo o único fim é tapar o sol com a peneira. Por que tanto problema com a sagrada portinha por onde a humanidade entra e sai? Por que há tantos bonecos ainda sem penisinho? Por que tanta preocupação com o ânus se todos os gêneros têm o seu? Coitado do ânus! Tratamo-lo com o mesmo desprezo e preconceito com que tratamos os nossos resíduos urbanos e seus cuidadores. Palavrões continuam a desestruturar e tirar o equilíbrio dos conservadores, porque todos sabemos que o que ralmente assusta a esses senhores é o fundo sexual ao qual todo palavrão remete. O que bebemos e o que comemos será eliminado por nós, mas os orifícios e órgãos responsáveis por esse serviço fundamental para a dinâmica metabólica de nossa saúde não tem glamour nem nobreza e a sexualidade ainda piora sua reputação. É grave. Está resultando numa sociedade cheia de prisão de ventre, preconceitos e contradições aumentando o número de receitas tarja preta. Reparou como tudo está na educação? Reparou que um país que não tiver uma política educacional consistente e consequente para um futuro são,  não se estabelecerá sem a violência e a dificuldade de convivência que continuamos a assistir? O certo é que também a nutrição, como base da saúde está fora da informação escolar.
Felizmente, visionários, competentes profissionais de cada área, sonhadores e artistas de plantão, furam o esquema e mudam o rumo dessa prosa. Esses dias mesmo assistindo a novela “Aquele Beijo”, do Miguel Falabela, mais meus olhos se revelaram atentíssimos à aquela obra em cartaz num horário em que muitos jovens estão com os olhos colados na TV. A personagem Cláudia, vivida pela atriz Geovana Antonelli, em mais uma excelente atuação, diz com a naturalidade e displicência coloquial que o texto pedia:” pera aí que eu vou fazer xixi”. Foi a primeira vez que vi. Em anos de novela jamais vi essa cena. Talvez seja pioneira mesmo na dramaturgia da televisão brasileira, diga-se de passagem, a mais avançada do mundo. Aliás, é raro alguém ir ao banheiro nessas tramas. Raro também é ver alguém lendo um livro, é merchandising de livro dentro da história, uma coisa de tão fácil inserção! É raro  uma biblioteca compondo o ambiente, a não ser como fundo de escuros escritórios. Umas bibliotecas mortas. Aliás, poucas vezes livro é assunto. É Miguel Falabella quem de novo nos socorre. Além de suas poéticas narrativas, vi no mesmo capítulo um personagem adolescente que cita alguma coisa muito bonita, comparando o amor com um rio que sempre volta ao seu leito original, cujo curso ninguém é capaz de impedir ou mudar. Perguntado pelo pai onde aprendera tais bonitos e profundos pensamentos o jovem respondeu com um singelo sorriso: “onde meu pai? ora, onde seria? nos livros, nos livros!”Alô, alô televisão, escola, família, é a vida a matéria da educação. Melhorar o mundo é a sua razão.
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Um comentário:

Diego Cerqueira disse...

A verdade sem peneiras e com uma linguagem acessível e direta sobre Educação. Como professores, precisamos romper as barreiras que a sociedade consolidou, principalmente, no ensino de ciências e biologia.